sábado, 31 de dezembro de 2016

... TENHO PULADO ALMOÇO...

Ulisses  Ferraz 

(publicado originalmente em ulissesferrazblogspot.com e captado via Facebook, com autorização do autor)

tenho pulado almoço
atropelado jantar
sentido sede
tenho andado a pé
tomado chuva
buscado a fé
tenho observado as cores
atravessado as noites
virado os dias
tenho tropeçado em amores
escorregado em paixões
enganado as dores
tenho ignorado o tempo
apressado o vento
desafiado a razão
tenho perdido a mão
achado o sol
estado só
nesses tempos de golpe
tenho envelhecido demais
vivido de café e esperança
e esquecido até do futebol

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

DIA 30 DE DEZEMBRO DE 2016

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Ana Lagoa




Há um ano, já sabíamos que o bicho ia pegar. Tudo estava mais que anunciado, explicitado descaradamente nas "bombas semióticas" ou, como queiram, na "novilíngua" dos doutrinadores midiáticos. Nós, os perplexos acometidos de choques anafiláticos a cada ignomínia diária, talvez acreditássemos na máxima "o mal não pode ganhar sempre". Mas ganhou. Despeço-me deste ano, que nos esmagou (embora como " indivídua" reconheça que foi um ano rico em saúde, afeto, amizade e o amor, sempre o especial amor), sabendo que somos hoje UMA NAÇÃO RETALHADA. Alterno meus muito particulares momentos de alegria com outros em que me sinto como virada do avesso. Em carne viva. Espectadora (sim, porque tenho consciência plena na minha inutilidade na luta) de um drama que não tem limites. Os poderosos retalham tudo que foi construído - não pelo PT, Dilma ou Lula, mas em muitas décadas de lutas, em todos os setores) e seguem - no salão nobre do palácio - se lambuzando com os pedaços desta terra e de seu povo. Enquanto isso, nas outras dependências, ratos e lacraias devoram tudo que lhes parece bom, que lhes passa pela frente, um cargo, uma mesa grande, um carro oficial, um jatinho, um sorvete, um pedaço de poder. Em cada canto deste país se processa a incessante desmontagem para que esses seres repugnantes ocupem os espaços de poder e grana. Mas não se desmonta apenas as estruturas de poder e de produção. Desmonta-se a identidade, aquilo que o nosso Darcy Ribeiro chamava de POVO BRASILEIRO. Desmonta-se há décadas. Com o incessante trabalho da midia lacaia do Império, com a desqualificação do Humano, em novelas e pretensos programas jornalísticos ou de entretenimento. Desmonta-se quando se derruba a barreira entre o que é público e o que é da esfera do privado, com aberrações do tipo BBB. Desmonta-se quando pelo país afora são aniquiladas nossas heranças culturais, pois enquanto o Governo oficializava o que chamam de "capítal intangível" (povo e cultura tradicionais), foram sendo banidas nossas lendas, crenças, um universo simbólico e suas representações sociais, condenadas e excluídas fisicamente, taxadas de "coisas do demo". Completa-se com o golpe de 2016 um ciclo de bem arquitetado projeto de aniquilação de uma Nação que nem bem se reconhecia ainda. A Cultura mais forte, mais parruda, mais poderosa do continente (para o qual damos as costas e uma banana sempre que podemos) se desfez, por décadas, sob nossos olhos, arregalados, possessos ou passivos, acomodados, resignados. O Império sabe o que faz. São profissionais da empresa do saque. Onde é mais fácil, enviam bombas. Onde existe uma cultura forte, primeiro destróem suas bases. Eles sabem, um povo que abre mão de sua cultura se torna vassalo. Não tem energia vital para a reação em escala suficiente para enfrentar o monstro. A CULTURA de um povo é sua energia KI, sua kundaline. Sem ela, não há gozo nem luta. Não há humanidade. Só bonecos vazios, só países em farrapos. Que este ano que começa passe rápido. E que possamos encontrar formas mais efetivas de resistência. Que os isolados núcleos de "formiguinhas" achem o link entre si e se fortaleçam. Que os afro-descendentes se fortaleçam e resistam. Que a consciência tome lugar na alma brasileira. Porque a guerra mal começou. E vai durar décadas.

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

RESSACA

Irajá Menezes


Sabe por que 88% dos brasileiros acreditam que o "sucesso financeiro" vem de Deus? Porque nessa pironga desse país a gente não tem INSTITUIÇÕES. Aqui é cada um por si desde 1500 e depois de 13 anos falando em "política pública" a gente se iludiu achando que o paradigma tinha mudado. Não deu nem pro começo, Jão! Sabe essa festa da uva que virou o governo federal, onde manda quem pode, obedece quem tem juízo? É o cotidiano de qualquer pessoa que more afastada do centro - esse lugar onde cê mora e que tem água, energia, varrição, luz no poste, asfalto, calçada, esgoto, alvará pra construir... Na perifa, fio, nos sertões, bem diferente do centro, presença do Estado, aquela que não falta mesmo, é, antes de mais nada, polícia. Pra fazer com bala de verdade o que eles andam fazendo com os nossos filhos nas passeatas - aqui no centro. O camarada que tem que sobreviver na jungle - áspera, dura e forte, como dizia o Dante Alighieri - já nasce sabendo que é na unha. Daí vai a gente - que tem água, energia, varrição, luz no poste, asfalto, calçada, esgoto, alvará pra construir e PM gente fina comendo pão com manteiga na faixa na padaria do bairro, e diz que os caras da pesquisa são ignorantes. O cristianismo, aquele de 2000 anos atrás, inovou ao dizer que o ser humano resolve suas paradas falando diretamente com Deus, sem intermediários. É a invenção do individualismo no Ocidente. Vai dizer que cê não tinha percebido? A revolução - a comunista - é o oposto do individualismo. É a ideia da ação coletiva resultante dos embates sistêmicos do capitalismo. É proposta tão completamente mundana que incluiu - sem nenhuma necessidade, diga-se de passagem - o ateísmo em seu "corpus" ideológico. Somente um cabeça de parafuso, arroto de Fanta, que nem o Frei Betto pra insistir nessa conversinha mole de que Jesus de Nazaré foi o primeiro comunista. Que a "solidariedade" cristã é o mesmo que o "igualitarismo" comunista. A mensagem do Cristo é coisa que se presentifica dentro de cada pessoa. Eu com o outro, eu com Deus. No limite, o cristianismo é antipolítico. O comunismo é radicalmente político. Eu perante a História. Que os dois sejam igualmente e insuperavelmente utópicos é outra discussão. O fato é que um é aqui e outro é no Céu. Um no tempo, outro na eternidade. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Assuma os seus B.O.s, sendo cristão, ou "de esquerda". Ou os dois. Mas não confunda. Enquanto isso, os brasileiros que creditam a si próprios e a Deus o seu sucesso, ou insucesso, veja bem, não têm nada de burros, ou manipulados. Instituição, no Brasil, é que é miragem. Instituições frágeis são o mecanismo clássico de manter o atraso. Nos países atrasados o bem público existe, mas é o mesmo que privilégio. Pegaria super bem se nós, os que ocupamos socialmente o lugar que tem água, energia, varrição, luz no poste, asfalto, calçada, esgoto, alvará pra construir, polícia, saúde, educação, ou seja, benefícios do ESTADO, portanto, PRIVILÉGIOS, largássemos o nosso farisaísmo de exigir dos outros o impossível e, com isso, deixasse de esconder - da gente mesmo - que a rapaziada tá correndo atrás de ter direitos sem esperar nada da gente. E, vendo bem, estão pra lá de certos... Cada um por si e Deus por todos.

domingo, 25 de dezembro de 2016

Jorge Marcio Andrade

Aos amigos e amigas envio meu estudo em aquarela com o meu En tarde tecer, 
no desejo de que o poente traga a Lux necessária para que possamos superar 
tudo o que nos obrigaram, tudo que nos tiraram, tudo que achamos que tínhamos perdido, entretanto, há um Solar desejante que ainda nos intensifica 
e outras cores virão se a elas nos dedicarmos de coração...
Fiquem com um trecho de Fernando Pessoa 
que sempre me acompanhou: "BEBER A VIDA num trago, e nesse trago.
Todas as sensações que a Vida dá
Em todas as suas formas [ ... ] 

(A Falência do Prazer e do Amor)

-imagem publicada - um estudo em aquarela, pintado por mim, recentemente, ainda sobre e para além do meu luto paterno, com cores predominantes em azul ultramar, amarelo3, amarelo escuro, preto, marrom e suas misturas, nuances, seus muitos ''entre'', donde brota uma cópia de original pintado por Christophe Bone, recriado em um outro entardecer e pôr do Sol em mim... doceabraço (espero ainda estar olhando para estes horizontes ao AR LIVRE...em uma praia ou montanha com vista para o mar..., quem sabe minhas cores serão menos impressionistas?)
Aquarela de Jorge Marcio Andrade, postada em sua página no feice, em dezembro de 2016.
Louise Bourgeois (French-American, 1911-2010). Spider II, 1995. Bronze.Da página Sculpture, compartilhada pelo Liu Sai Yam em sua página no Feice

A ESTRATÉGIA DA ARANHA


 Liu Sai Yam

O olhar pagão santifica a serenidade da narrativa sacra, cuja lição maior é o silêncio reflexivo dos andarilhos, refugiados, magos e ruminantes, todos igualados na noite fundamental. E exatamente à meia-noite, quando se afirma a necessidade do silêncio, discípulos do modismo disparam rojões, gritam pelas ruas, acionam a parafernália sonora, em reveillon extemporâneo, impróprio, sem sentido, truculento. Se essa expansividade é agressiva mesmo durante a noite da virada, o que dizer quando cometida por qualquer motivo? O exercício da estupidez mediante a violência contra todos, em democratização sórdida da alegria forçada, da violação do direito à paz. Assim caminha a inumanidade, pais dando exemplo a filhos, adultos instruindo crianças, irresponsáveis reproduzindo irresponsáveis, projeção futura de espancadores, molestadores, estupradores, linchadores, e todo o naipe de cretinos que rimarão festividade com bestialidade. Pasolini, profeta e vítima, anunciou o evangelho "do pavoroso mundo antigo e do pavoroso mundo futuro".
E, apesar de tudo, nunca abandonou a esperança na beleza que nasce dos escombros... Por ele, pelos meus, pelo melhor que plantaram em mim (e que atenua o meu pior), não renego minha cidadania ao gênero humano, tanto como os que berram alucinados pelas ruas, como os amigos do peito, os que curtem o santo silêncio.

sábado, 24 de dezembro de 2016

VOU LOGO ALI E JÁ VOLTO

Adroaldo Bauer Corrêa


Não que seja indiferente ao ocorrido e ao que ainda se passa.
Nem que não tenha ganas ou tenha sofrido ou queira gritar.
Estava já programado eu sair do estado. Ainda apenas por pouco.
Avisa lá que vou e volto, entanto.
Não se verão livres de mim mesmo que nos tenham vencido.
Respiro fundo, seco o olho e relembro nosso canto.
Não há derrota definitiva pros de baixo.
Avante!
Venceremos!

INCLUA ONDE COUBER

 Adroaldo Bauer Corrêa

  BR
RS
PA
EMENDA LIBERAL
Mais mercado, menos estado.
Mais negócios, menos serviços.
Mais lucro e espoliação,
Menos investimento e superação.

TEM AINDA MAIS UM ANO

Adroaldo Bauer Corrêa

TEM AINDA MAIS UM ANO: 2017 
Começo a ter preocupação grave e mesmo impaciente 
com a quantidade cada vez maior de gente apostando todas fichas em 2018.
Descobriram a máquina do tempo com teletransporte de massas 

ou vão jogar o calendário novinho no lixo sem dar conta dos 365 leões à espreita?
Apenas fechar os olhos 

ou ir pescar não vai resolver como atravessar 2017.

2016

André Vitor

Resumo de 2016:
Fiquei grogue nas cordas o ano todo.
Mas perdi os combates por pontos: nenhum por nocaute!

É preciso ficar de pé.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016


VÉSPERA DE NATAL

Liu Sai Yam

Quando o pau quebrou?
Espera por mim, choque!

Detratores infames 
espalham que eu tava "correndo de...", 
quando os meus amigos sabem 
que eu "corria contra...", 
ou, "pra cima...", 
bem de acordo com o meu lema (meu e do Van Damme): 

"Retroceder nunca, render-se jamais".

PARA ONDE IRÃO???


Ana Lagoa


Saltita
meio de porre
na frente do meu portão
um jovem negro
- negro negro -
quase azul,
dos quilombos das encostas.

Que natal terá ele?
sem salário
sem plano de saúde
sem previ.
Abre o sorriso
alcoólico
pega a caixinha
e sai pulando
enquanto os amigos
tão desvalidos quanto
vão catando o lixo
e cantando...
...não, não um samba da terra
mas um funk do colonizador.

Greve de 1907

Greve de 1907. Por 8hs de trabalho. Fonte: página do facebook do Jesus Carlos de Lucena.

1907 - ESCRAVOS DA ERA MODERNA



Não havia leis regulando o mundo do trabalho. 
Crianças trabalhavam pela comida, para que ficassem junto dos pais.  Ou eram cedidas (arrendadas) pelos orfanatos.
Mulheres ganhavam menos que os homens. 
Todos davam jornadas de 12, 14, 16 horas dependendo o tipo de fábrica e do caráter do patrão. 
Não havia descanso semanal, a não ser quando o patrão era religioso e abria o domingo para a missa. 
Os operários moravam em vilas separadas da cidade, em geral recebiam o salário em tíquetes que trocavam por alimentos no armazém das fabricas, onde os preços não eram "de ocasião". 
Fábricas, campo de lavoura e mineração, todos seguiam esse mesmo modelo. 
A série A Fábrica, exibida no +Globosat; Germinal, Santa Maria de Iquique e a obra de Chalres Dickens mostram como era o mundo do trabalho nessa época.

ENQUANTO SE MATAM, COMEMOS A MESMA COMIDINHA COM SOTAQUE



Ana Lagoa


Descobri o falafel vagando pelas ruas de NY em um dia 12 de outubro pré-Torres Gêmeas. Vários quarteirões cheios de gente e barracas de comidas de todo o mundo. E lá estavam os rapazes com caras de árabes, com seus cabelos e olhos negros imensos. NO tacho bolinhos amarelos flutuavam gritando em óleo de gergelim fervente. Um dólar. E um deles tirava o bolinho do tacho, colocava em um suporte de papel, abria ao meio e colocava ali o molho escolhido. Feito de massa de feijão e especiarias, o falafel é tio avô do acarajé, com certeza, sem o dendê. Ai vou na feira das colônias e dou de cara com ele, o falafel, mas não na barraca dos sirios, ou dos libios, ou dos egipcios, ou dos armênios... mas na barraca de Israel, onde pessoas claras, de olhos claros e cabelos ralos, se esmeravam em fazer as apresentações. Olhei para eles, agradeci poder rever esse bolinho fantástico, pedi o meu no prato com pasta de grão-de-bico azeda, uma saladinha de repolho bem fininho e pão (sírio???). 

Ponho o primeiro pedaço na boca, sinto o cheiro dos temperos (árabes????) e ouço ao longe, bem longe, tiros e bombas caindo onde o deserto encontra o mar sujo de óleo negro e sangue.

MÃOS E HINOS




 Ana Lagoa

Enquanto toca fervilhante Polonaise,

Horowitz olha de lado e me diz:

voce tem mãos ágeis,

por que não veio tocar comigo?
Mas eu estava longe demais

para ouvir o que ele dizia.
No meu ouvido

ficou apenas

a memória do som do piano,

MAS A MUSICA ERA A MARSELHESA.